A Carris quis mudar as carreiras em Lisboa. A Camara de Lisboa lah refilou e tal, mas a remodelacao deu-se.
O que os Sres da Carris nao sabem eh que terao ditado o fim a amizades de anos, a amores passados e futuros, a rotinas de vida que para mim como para tantos outros diariamente amenizavam a merda do facto de apanharmos a primeira carreira do dia. Que ainda era de noite.
Estou a falar dos habitues. Os paraquedistas, esses nao tenho qualquer respeito por eles. Ha que ficar fiel ah sua carreira, caramba.
Quando chegava ah minha paragem jah lah estava o Sr de meia idade, chamemos-lhe assim. Cumprimentavamo-nos com um "bom dia" enssonado e quando o autocarro encostava deixava-me sempre entrar primeiro com honras de jantar de luxo.
Eu - Bom dia, quanto eh?
Motorista - Esta a brincar comigo? Ainda nao sabe?
Eu - Errr, pois, sim sei, mas esqueci-me.
Motorista - 1.20. Ainda gostava de perceber porque eh que a Sra anda a pagar bilhetes se anda nisto todos os dias.
(notem como o Sr. motorista me trata com deferencia. Mesmo a tratar-me como um asno, nao deixa de me chamar de Sra.)
Eu - Errr, pois, mas sabe, jah pedi o passe mas demora a entregar. E depois ainda tenho de comprar o selo. E nao tenho tido tempo e ...
Entretanto lah me sentava sob olhar cumplice e carinhoso da velhota dos sapatos verdes e do rapaz da pulseira de ouro. Ambos apanhavam o autocarro na paragem antes. A primeira paragem.
Mais abaixo entra a Sra de meia idade, sempre envolta numa aura neglige xique patrocinada pela loja chinesa mais proxima. O Sr de meia idade faz-lhe uma venia e levanta-se para a deixar para ao peh da janela. Conversam educadamente o resto da viagem.
Pouco depois eh a vez da Rapunzel, a rapariga ruiva do cabelo estupidamente comprido e do velhote do saco deportivo preto em punho. Sentam-se os dois ao peh da velhota dos sapatos verdes. Trocam uns cumprimentos mas sem grandes intimidades. Nao eh como a oferecida da neglige xique.
A Rapunzel foi operada ha pouco tempo, anda devagar e traz sempre umas olheiras de palmo. Eh nova mas ve-se logo que eh daquelas que jah nem o marido quer comer. Ar de desgracada. E tem franja.
Sai adiante com a velhota dos sapatos verdes. O velhote muda imediatamente de lugar para ficar virado para a frente e coloca o saco preto em cima do banco adiante.
Pouco depois eh a minha vez de sair, lado-a-lado com o rapaz da pulseira.
O que se passa depois nao sei mas supeito que se comente o facto de eu todos os dias comprar o bilhete em vez de pedir o passe.
Ahs sextas-feiras, ah medida que vao saindo, os meus amigos - sim, os meus amigos - vao olhando em volta e dizendo: "-ateh segunda, bom fim de semana."
Ora, tudo isto se perdeu. E isto sao perdas que nao se leem nos cabroes dos numeros da racionalizacao da Carris.