Rabo de Saia

Os factos aqui contidos são reais e qualquer semelhança com a ficção é mera coincidência.

 

segunda-feira, outubro 10, 2005

Um dia cinzento


Cores políticas aparte, Portugal acordou hoje pejado de nódoas difíceis. E as mais óbvias têm nomes: Fátima Felgueiras, Isaltino Morais e Valentim Loureiro.

De entre todos os momentos de glória a que ontem assisti na caixinha mágica, elejo o discurso de vitória deste último. Enquanto fungava, agitava freneticamente os braços e praguejava contra os responsáveis pelo não funcionamento do microfone, Valentim Loureiro deixou bem clara a boçalidade do seu projecto para Gondomar.

E o eleitorado – não só o daquela cidade, leia-se – deixou bem claro que abdica da integridade e da ética em prol de resultados “práticos”. O que é mau sinal, porque significa que já se conformou em comprometer alguma coisa. Isso torna o eleitorado pouco exigente consigo próprio e com a classe política.

Eu continuo a acreditar que o que se avança em quilómetros de estrada, regride-se em civismo. E esse é um compromisso que eu jamais subscreverei.

Pessoalmente, sinto-me enganada. Porque o acto eleitoral de ontem foi de tal forma envolvido em tantos e tão veementes apelos à não abstenção que eu cheguei a acreditar que a vida – no meu caso em Lisboa – melhoraria, de facto.

Resta-me o consolo de se ter feito justiça em Lisboa. Depois de governar sob a sombra de Santana Lopes e fazer trabalho de sapa sempre envolto em paternalismos e críticas à sua “falta de carisma”, Carmona tem agora um mandato com direito a assinatura.

Como se o primeiro dia assumidamente invernoso não chegasse, a minha rua amanheceu inundada, já que os varredores há muito que acumulam o lixo das ruas dentro das sarjetas, o que as leva a entupir.

Alheia a estas vicissitudes, a Beatriz foi a única que tirou partido do facto e testou até à exaustão a capacidade impermeável das galochas e do casaco de joaninha. Qual salta-pocinhas, qual quê.

Depois de milhares de decibeis de buzinadelas, intermináveis pára-arrancas e litradas e litradas de esguichos de automóveis indiferentes às poças e aos peões, deixei a salta-pocinnhas na escola.
Ainda tive tempo de parar no banco onde encarei com frieza o gerente que tem na gaveta há meses um pedido meu de reavaliação do meu crédito habitação. Outrora trocávamos larachas e até frequentávamos o mesmo ginásio. Hoje aguardo o momento oportuno para arregaçar as mangas e mudar de banco.

Foi com alívio que saí de Lisboa e encarei a ampla auto-estrada rumo a Oeiras. Mas eis que surge uma loura esvoaçante que se lembrou de repente que era aquela a sua saída e forçou a travagem a fundo de pelo menos seis outros carros, entre os quais o meu.

Fora este um dia de sol e talvez encarasse esta manhã de forma mais bem humorada, mas dadas as condições meteorológicas, tal não é de todo possível. Todavia, não basta bradar aos céus, mandar piropos nas mesas dos cafés e amaldiçoar os políticos.

O varredor não se importa com a qualidade do serviço que presta; o gerente do balcão do banco não quer saber do meu bem estar apesar de ser cliente e a loura acredita que a sua brusca mudança de curso é mais importante que a vida dos que circulam em seu torno. Esta é a dura realidade e enquanto for este o povo que temos, não podemos esperar melhores políticos.

Um pouco por todo o lado, as notícias chegam-nos em forma de metáforas coloridas. Ora é o laranja que avança, ora é o rosa que empalidece. Pela parte que me toca, e por todas as considerações acima tecidas, eu hoje vejo o dia bem cinzento.

2 Espreitadelas:

Em 5:40 da tarde, Blogger Filipe de Arede Nunes disse...

Bom trabalho, revejo-me absolutamente neste post. Parabéns pelo blog.

Em 9:01 da tarde, Blogger Assessora Pipinha disse...

as comadres agradecem e convidam-no a vir blogar para esta freguesia sempre que lhe aprouver :)

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